Em abril de 2021, eu pedi demissão de um emprego que eu achava que era o emprego dos sonhos.
Entre noites mal dormidas, uma pandemia (aquilo aconteceu de verdade?) e uma chefe controladora, eu me vi muito perto de um burnout.
Graças as condições que minha família se encontrava naquele momento, optamos por eu ficar de boa em casa e o marido bancar as contas por um tempo indeterminado.
O que parecia ser as férias do sonho se transformou em algo muito mais difícil do que eu teria imaginado. Descobri que eu sou um pouco workaholic, e senti falta de trabalhar. Claro que sempre gostei muito da minha profissão, mas uma grande parte da minha identidade sempre esteve ligada à minha profissão. E sem trabalhar, quem era eu?
Algumas outras coisas interessantes aconteceram também. Eu percebi que atrelava a minha importância como cidadã no mundo como alguém que era útil de alguma forma. E sem trabalhar, eu não me sentia útil ao mundo, e isso também bateu em mim de uma forma diferente.
Ao longo dos meses, as coisas não melhoraram. Eu continuava me sentindo culpada por não estar trabalhando e vendo TV as 11 da manhã num dia de semana. Se o marido trabalhava de casa, eu me ocupava com mil coisas pra que ele me percebesse como alguém que estava fazendo mais do que apenas vendo TV.
E da onde saiu essa nóia toda? Da minha cabeça, claro, porque ele nunca falou nada sobre isso.
Fiquei pensando em como carregamos essa sensação de culpa eterna.
Quando eu trabalhava muito, a culpa era não ficar com o meu filho.
Quando eu pedi demissão, a culpa era não ser útil além da maternidade.
Ciclo maldito que deixa a gente se sentindo mal o tempo todo.
E ele começa sem a gente perceber. Eu tinha muita dificuldade de falar não no trabalho. Medo de que aquela fosse a minha única chance - e não poderia desperdiça-la. Não sei da onde a gente tira isso, de que a gente só tem uma chance e nada mais, e que devemos agarrá-la com os dentes - mesmo que isso te deixe banguela.
Demorei pra enxergar que não estava bem, e quando pedi demissão, o estrago já estava feito. Caminhei no meu último dia com dor nas costas, e essa dor demorou umas duas semanas para passar.
Mas passou
.
E ao longo desses mais de dois anos desde que pedi demissão, muita coisa mudou. Primeiro, eu aprendi que o melhor trabalho que EU posso fazer é ter tempo para ficar e cuidar do meu filho (sem me preocupar com o que eu vou fazer nos dias que ele não tem aula - imigrantes sabem que esses dias são duas vezes mais difíceis para quem não tem rede de apoio).
Aprendi também que o meu valor não está atrelado a minha profissão - e o aprendizado maior foi que só eu posso cuidar da minha saúde - e mais ninguém.
Só depois desse pedido de demissão eu tive tempo para me encontrar com a minha criatividade e enxergar a escrita como prioridade - e não aquele encaixe no dia que dá.
Eu pedi demissão do emprego que eu achava que era dos sonhos - e foi aí que eu comecei a sonhar.
RECOMENDAÇÕES & LEMBRETES DA SEMANA
Essa semana eu ouvi um podcast muito interessante chamando A Coach, do jornalista Chico Felitti. Nesse poscast, Chico investiga a vida da modelo/escritora/miss/coach Kat Torres, que foi presa no ano passado. Essa história não chegou na minha bolha, e eu não tinha ideia de quem ela era, mas adorei ouvir a investigação dele - e fica aqui a recomendação!
Obrigada pela companhia nesta segunda e até a próxima semana!
Passei por algo semelhante nos últimos dois anos. Não me demiti porque estava autônoma. Esgotada, pausei. E me senti inexistente pro mundo. Passou. Até reencontrei caminhos recentemente, mas de outro jeito. Entendi que sou mais do que o que faço como “trabalho”.