Esta é a penúltima newsletter da série sobre as emoções primárias segundo Paul Ekman, e - sim - eu havia dito que hoje escreveria sobre a alegria. Aconteceu, porém, que na medida em que avançava na preparação do texto, percebi que faria muito mais sentido tratar da alegria por último. Não porque eu queira dar um grand finale para a série. O motivo tem a ver com a própria dinâmica das emoções, com uma análise mais geral da estrutura da nossa vida emocional. No texto sobre a alegria, isso ficará bem claro.
Pois bem, falarei então aqui da tristeza, e também da agonia, a sua manifestação desesperada. De uma maneira geral, podemos dizer que a tristeza é a emoção da perda. A morte de um ente querido, e principalmente de um filho, é a causa universal para essa emoção. E todos os outros gatilhos possíveis também estão ligados a algum tipo de perda ou fracasso. Ficamos tristes quando somos rejeitados por um amigo ou por um amante; quando deixamos de contar com a admiração de alguém que respeitamos e valorizamos; quando falhamos em atingir um objetivo desejado; quando perdemos algum objeto valioso ou que estimamos muito; quando uma parte de nosso corpo está doente, ou com funcionamento prejudicado.
A tristeza é uma das emoções mais longas. E quando a perda é muito grave, podemos alternar uma tristeza resignada, desesperançosa e passiva, com um estado emocional mais agitado, marcado pelo protesto e pelo desespero, um estado que podemos chamar de agonia. Para a maioria das pessoas, é penoso testemunhar a agonia alheia. Observar uma pessoa desesperada por uma grande perda também pode ser um gatilho para a nossa própria tristeza.
Uma das defesas naturais para a tristeza é a raiva. Muitas vezes, quando nos sentimos tristes, e principalmente quando somos tomados pela agonia, tendemos a procurar alguém para culpar. O gatilho paradigmático para a substituição da tristeza pela raiva é a rejeição. A raiva que sentimos do amante ou do amigo que nos rejeitou possui uma função curativa para a nossa tristeza. Se não a suprime de fato, pelo menos a atenua.
Não estou dizendo que essa seja a melhor solução. Longe disso. A raiva pode mascarar a situação e nublar a nossa compreensão da circunstância que gerou a rejeição, impedindo o autoexame e a superação de questões que talvez pudessem ser superadas. Para qualquer coisa na vida, a melhor solução é sempre a verdade. Tudo o que dissimula a verdade dos fatos, e embota a nossa autoconsciência, acaba nos sendo prejudicial a médio e longo prazo. Por isso, é melhor aguentar a tristeza, e dissecá-la, do que arranjar um culpado.
Quando estamos tristes, tornamos esse fato conhecido, involuntariamente, por meio de nossas expressões faciais. Há mudanças consideráveis em nosso tom de voz. Nossas bochechas se projetam para cima, ao mesmo tempo em que o olhar, as pálpebras superiores e os cantos dos lábios se projetam para baixo. O aspecto de fragilidade criado por essa fisionomia atrai a atenção das outras pessoas e apela para o seu senso de cuidado e proteção.
Isso é particularmente verdadeiro quando quem sofre é uma criança. Oferecer conforto a uma criança em agonia é um impulso quase universal. Eu digo quase porque, infelizmente, há pessoas que não se compadecem com o sofrimento dos outros. Aliás, uma das diferenças fundamentais entre as pessoas é o modo como reagem ao desespero alheio. Não é muito difícil imaginar o quanto o sentimento de compaixão foi importante na marcha da história humana; o quanto a humanidade se beneficiou do fato de haver na maioria de nós uma sensibilidade para o sofrimento dos outros que nos leva a oferecer ajuda a quem está precisando. Esse é um dos pilares do senso de comunidade.
Mas a tristeza pode se tornar crônica, e isso tem a ver tanto com uma predisposição neuroquímica quanto com as circunstâncias da vida da pessoa. Já vimos que toda emoção tem um transtorno correspondente, e o da tristeza é a depressão. Não devemos confundir a tristeza, como experiência emocional que dura alguns minutos, horas ou dias, e cujo gatilho é plenamente identificável, com uma depressão que se prolonga por semanas e meses. Uma pessoa deprimida não consegue sair do estado de tristeza sozinha. Necessita de ajuda especializada, profissional. Quando a tristeza se torna fora de controle, quando tira de alguém a capacidade de viver e conviver, tornando a pessoa disfuncional, é preciso ligar o sinal de alerta.
A pessoa triste está simplesmente reagindo a algo que experimentou como perda. Ela precisa ser confortada para que recupere o ânimo, reabasteça as energias, e siga em frente. A pessoa deprimida abandona-se à tristeza porque está privada do seu elan vital, ela perde a alegria de viver.
E por falar em alegria de viver, até lá. Não deixe de abrir o próximo email!
Um abraço,
Cristiane