Os movimentos da vida emocional
Por que nos emocionamos e como adquirir um domínio mais consistente sobre as nossas emoções?
Logo no início de “Emoções Reveladas”, Paul Ekman já adverte o leitor: não podemos evitar a experiência emocional. E felizmente. Imagine como seria monótona a vida se não nos emocionássemos nunca. Porém, o fato é que boa parte de nossos problemas e aflições podem ser creditadas, direta ou indiretamente, a um descompasso entre a realidade e o modo como reagimos a ela.
Quem nunca se arrependeu do que disse ou fez num momento de descontrole emocional? Quem nunca se viu, repentinamente, traído por uma emoção inadequada ou desnecessária? Por que isso acontece? Por que, tantas vezes, sentimos o que não devemos sentir ou expressamos o que não devemos expressar?
O descompasso entre a realidade e a emoção pode se revelar em três tipos de cenários:
1. Quando experimentamos uma emoção apropriada, porém em uma intensidade desproporcional. Exemplo: temos motivo para ficar preocupados com alguma coisa, mas reagimos exageradamente e ficamos aterrorizados.
2. Quando experimentamos a emoção apropriada, mas a expressamos de maneira inapropriada. Exemplo: temos motivos para sentir raiva, mas intensificamos a situação de conflito ao expressar nosso sentimento com agressividade descontrolada.
3. Quando experimentamos uma emoção simplesmente inapropriada à situação. Exemplo: sentimos medo de algo que na verdade não representa nenhuma ameaça. Sabe aquelas pessoas que se descontrolam diante de insetos inofensivos, como borboleta ou besouro?
Ora, para entendermos os motivos pelos quais nossas emoções se apresentam tantas vezes de forma inadequada ou equivocada, precisamos antes ter clareza a respeito do papel que elas exercem em nossa vida. Normalmente, nós nos emocionamos quando estamos diante de uma situação, evento ou objeto que percebemos como relevante para o nosso bem-estar. São os chamados "gatilhos emocionais”.
Possuímos mecanismos neurológicos de avaliação automática ("automatic appraisers") que, ao detectar a presença de um gatilho, deflagram nossas emoções antes mesmo que possamos fazer uma leitura consciente do que está acontecendo, antes mesmo que tenhamos tempo de absorver racionalmente a situação. E, uma vez desencadeado o processo, a emoção tende a fluir em todas as suas manifestações: mudanças fisiológicas, expressões faciais, predisposição para certos tipos de ação, etc.
É preciso que seja assim, caso contrário podemos perder o timing da ação necessária. Imagine que você está parado em um local e ouve um som muito alto de explosão ou colisão. Caso se trate de algo realmente temerário, é melhor que você esteja preparado para fugir ou se proteger antes que seja tarde. E é isso, precisamente, que a emoção que chamamos de “medo” faz por você.
Chegamos então ao ponto exato que nos interessa. Os gatilhos mais instintivos, ou seja, aqueles que herdamos do nosso passado enquanto espécie, em geral são muito úteis e positivos. É o caso da associação imediata entre barulho de explosão e perigo iminente. Porém, ao longo da vida, vamos colecionando gatilhos que muitas vezes não protegem o nosso bem-estar, que nos atrapalham mais do que ajudam. A educação é um verdadeiro manancial de gatilhos, tanto para emoções positivas ou negativas.
O fato é que, se queremos construir uma existência plena de sentido, é muito importante que não sejamos escravos das nossas emoções. É preciso evitar que as emoções nos impeçam de trilhar o reto caminho e enfraqueçam a nossa vontade diante das dificuldades da vida. Mas como fazê-lo?
Embora não possamos alterar o processo neurológico de “avaliação automática”, podemos, por outro lado, desenvolver um conhecimento consistente dos nossos gatilhos emocionais, um conhecimento que nos permita prever e administrar as situações que têm algum potencial para alterar o nosso equilíbrio.
Preste atenção em sua vida emocional. Procure identificar os eventos, situações, objetos e imagens que costumam deflagrar as suas emoções, principalmente aquelas que atrapalham a sua vida e causam aborrecimentos posteriores. Esse é um exercício importante. Um exercício de autoconhecimento puro e simples: conheça os seus gatilhos.
Comece pelas emoções básicas, primárias. Isso já vai lhe trazer uma sensação nítida de autocontrole. O que costuma fazer você sentir raiva, medo, alegria, tristeza e nojo? Quais as situações que levam você a estados emocionais indesejados? Anote.
Antes de terminar, preciso esclarecer um último ponto. As nossas emoções não são deflagradas somente pelos “mecanismos de avaliação automática”. Quando nos lembramos de eventos tristes, ou simplesmente os imaginamos, podemos ficar tristes. Quando conversamos com alguém sobre as nossas emoções, podemos experimentá-las novamente. Quando testemunhamos a experiência emocional de outra pessoa, podemos nos emocionar junto com ela. E, por último, podemos também experimentar uma emoção quando fazemos voluntariamente a expressão facial que costuma acompanhá-la. Experimente sorrir no espelho quando estiver triste ou deprimido(a). Observe. Você verá que alguma coisa acontece no curso da sua emoção.
Vamos continuar, junto com Paul Henman, nossa jornada na direção de um autocontrole emocional mais consistente. Na próxima newsletter, vou esclarecer o porquê de algumas pessoas terem mais facilidade do que outras para controlar as suas reações emocionais e/ou para inibir ou minimizar as expressões públicas de suas emoções. E também vou explicar de modo mais direto o que significa exatamente “autocontrole” na dinâmica das emoções.
Um abraço,
Cristiane Lasmar
Sensacional! A introdução é muito útil e esclarecedora