Entrevista com Josh Radnor: Uma meditação sobre a existência humana
Falamos sobre seu primeiro álbum solo, Ayahuasca, vida, morte e criatividade
Mês passado eu falei com Michael Benjamin sobre seu novo álbum, The World Is Still Beautiful, e agora foi a vez de conversar com Josh Radnor, uma das minhas inspirações como contador de histórias. Seu álbum solo de estreia, Eulogy, já está disponível em todas as plataformas digitais e eu recomendo muito que vocês escutem. Para mim, é uma jornada linda sobre vida e morte e o que é ser humano. E é justamente esse o foco do bate-papo de quase 40 minutos que tivemos — feito em parceria com minha grande amiga Maísa Cachos, do FolkdaWorld. Falamos também sobre Ayahuasca, criatividade, síndrome do impostor e o poder da arte na vida das pessoas. Ou seja, se você é fã do trabalho do Josh ou tem interesse por esses assuntos, vale muito a pena conferir.
Veja abaixo uma análise aprofundada sobre o álbum e a entrevista completa no fim da página. 👇
O particular é a porta para o universal
Essa foi uma das coisas que Josh Radnor disse durante o bate-papo que tivemos sobre o primeiro álbum solo que o artista lançou recentemente, Eulogy. A citação reflexiva define bem o que é o trabalho desse grande contador de histórias no decorrer de 12 músicas: narrativas e sentimentos particulares para um homem de 49 anos, que está prestes a se casar e que, durante os últimos anos, descobriu um novo grande amor na criação de canções. Mas que, de alguma forma, consegue universalizar tantas particularidades dentro da existência humana.
"Existe algo que as pessoas não conseguem expressar emocionalmente e elas estão dependendo de atores e artistas para canalizar essas emoções e mostrá-las para eles. Ou até lhes dar a permissão de sentir certas coisas em suas vidas"
Talvez seja por isso que a ressonância seja tão grande ao ouvir Josh cantar sobre a rebeldia dos jovens em Red, amores confusos em NYC, a necessidade de buscar o divino em Real Life e o aprendizado constante sobre sentir tudo que precisamos sentir em Learning.
Josh Blake Dylan
Do mesmo jeito que acontecia na colaboração com Ben Lee, quando os dois artistas criaram dois álbuns espetaculares onde também abordavam a universalidade dessa existência, Josh parece mais focado do que nunca em explorar os limites da sua escrita poética e lírica. As letras de Eulogy soam como uma mistura perfeita dos poemas de William Blake e os cânticos de Bob Dylan, especialmente por conta da tendência que Josh tem de contar histórias complexas dentro de quatro minutos, seguindo o estilo da lenda folk.
“Se as portas da percepção fossem limpas, o homem veria tudo como é: infinito”
Quem disse isso foi Blake, mas Josh Radnor parece exprimir a mesma ideia ao longo de cada despedida que acontece durante o álbum. Afinal de contas, Eulogy é sobre a morte. Nem sempre de forma literal, mas sempre sobre o fim de alguma coisa que nos dá vida, quase como se fôssemos morrendo a cada dia e também nos eternizando. Até porque não existe paradoxo melhor do que a própria vida.
Além do folk institucionalizado em seus outros trabalhos como músico (apesar de que o gênero parece mais um agente limitador dentro do universo presente nas canções de Radnor e Lee), Josh também se apoia em um recurso quase religioso, de repetição de versos — especialmente na última música, Joshua: 45-46 —, convidando quem está ouvindo a também participar da prece e da dança que é ser humano. Músicas como You Can Sleep Alone Tonight facilitam esse sentimento com a voz de Audrey Assad como vocal de apoio e os instrumentos de sopro, que elevam qualquer espírito.
Uma história contada em 12 músicas
Do mesmo jeito que acontece com uma narrativa cinematográfica ou literária, há uma história a ser contada ao longo de Eulogy, que ainda terá uma segunda parte lançada em 2024. Ela começa com uma projeção de um Josh Radnor jovem, rebelde e querendo mandar seus pais para aquele lugar. Depois disso, passa pela fase dos relacionamentos, românticos ou não, mostrando como é difícil viver nesse mundo junto com outras pessoas e sendo quem nós somos — o que pode ser bem difícil em alguns dias.
No meio disso, vemos um homem que explora a espiritualidade como uma nova forma de enxergar o mundo. Em seguida, passamos por mais uma etapa de relacionamentos românticos, que acaba com essa pessoa entendendo que o amor mais importante que existe é aquele que nutrimos por nós mesmos, especialmente quando estamos sozinhos. E no fim, nos deparamos com a epítome de tudo isso, com Josh aceitando a chegada dos anos e cantando sobre quebrar barreiras.
"Deus não é um teste, é um lugar onde posso descansar"
Talvez a minha frase favorita de todo o álbum, porque parece uma descoberta tanto para quem está cantando quanto para quem está ouvindo. E essa é a sensação durante toda essa jornada de despedida às partes que não mais servem ao interlocutor. E Josh faz isso ao mesmo tempo em que convida quem está ouvindo a pensar em sua própria eulogia: ao mirar em sua individualidade e suas experiências particulares, ele acerta quase todo mundo — definitivamente me acertou. E quando ele chega a uma conclusão, o convite é quase automático para que você reflita sobre aquilo também.
O particular é a porta para o universal. E Eulogy é isso. Tão particular que consegue, de muitas formas, ser universal. É um trabalho honesto e íntegro de um contador de histórias que, para a nossa felicidade, encontrou uma nova plataforma para compartilhá-las. Afinal, como ele canta em NYC: "Tenho algumas histórias na manga que ainda não foram contadas". E só nos resta a esperança de que Josh Radnor possa contá-las por muito tempo.
Todas as fotos são de Eli Greiss e a capa do álbum é de Jon Marro
Adorei!