Qual a relação de mão dupla entre o sal e o comportamento do sangueɁ
Resumos de FISIOLOGIA HUMANA 3 - Restrição de sal e sua relação com edema, viscosidade do sangue, coágulos e hipertensão. Sal-adrenalina-aldosterona.
[Imagem: klinikabudzdorov.ru]
O sangue de uma pessoa saudável tem sua pressão típica, fisiológica, que é chamada de pressão oncótica. Não pode ser maior ou o sangue tenderá a ficar mais viscoso e não pode ser menor ou teremos outros tipos de problemas. É uma das variáveis que deve permanecer oscilando em uma faixa estreita, de normalidade.
Existem determinadas substâncias – vamos chamá-las de solutos – que fazem parte do sangue e são especificamente elas as que garantem a pressão oncótica do sangue [C]. Ele possui a viscosidade e fluidez adequadas para ser bombeado a todos os sistemas suavemente e eficientemente por conta delas, dos solutos garantidores da boa pressão oncótica.
A pressão oncótica é uma pressão osmótica gerada pelas proteínas do sangue, principalmente pela albumina, justamente a que está em maior quantidade no plasma.
O sal e a albumina, de forma complexada [albuminato de sódio] é quem mantém a pressão oncótica do sangue [A].
Dotado dessa pressão e fluidez, o sangue não tende a extravasar para outros compartimentos. A distribuição dos líquidos corporais será mantida, já que ela se apoia naquela propriedade do sangue. Cuja base é a adequada disponibilidade de sal e de albumina. Que precisam vir da dieta proteica e do sal da alimentação.
Uma dieta restrita em sal, que não forneça o sal suficiente para manter aquela pressão oncótica irá, em consequência, promover uma desregulação entre os compartimentos sanguíneo, extravascular e intracelular.
A primeira consequência do sal insuficiente [hiponatremia] será o aumento da aldosterona [B], um hormônio produzido na suprarrenal e que vai agir nos rins – dentre outras ações – para tentar impedir perda de sal pela urina.
Ao mesmo tempo a aldosterona é uma molécula - de ação inflamatória – e que tem a propriedade de aumentar a pressão arterial.
O sentido dessa ação é tentar corrigir um desequilíbrio. Ou seja, acontece que com menos sal no sangue, o seu volume ficará menor por perda de fluidos plasmáticos para fora dos vasos, daí o coração terá que fazer mais esforço para fazer fluir o sangue. Ora, essa nova dificuldade para a bomba cardíaca será atenuada se houver vasoconstrição ao mesmo tempo em que se evita perda salina pelos rins. Chama-se resposta adaptativa.
Todo esse processo constitui, portanto, uma resposta adaptativa do organismo para tentar recompor a pressão oncótica fisiológica e impedir perda de sal [sinalizar para os rins façam com que o sal que iria ser perdido volte ao sangue].
É uma tentativa, estressante, de criar um novo equilíbrio para compensar aquele que foi perdido em consequência da falta de sal no sangue.
A vasoconstrição promovida pela aldosterona é reforçada por mais vasoconstrição produzida pela adrenalina. Dois hormônios vasoconstrictores, capazes de chegar a produzir hipertensão.
Outro processo é que junto com a vasoconstrição vem o aumento da permeabilidade vascular.
Que irá induzir a perda de albumina para o extravascular.
A adrenalina libera ácidos graxos dos depósitos, inibe a queima oxidativa do açúcar o que leva a aumento da permeabilidade capilar. Com menos produção de energia os capilares entram em hiperpermeabilidade.
O que pode ser observado, dinamicamente, é que a resposta adaptativa, fisiológica, à queda do sal acionou vários hormônios que usualmente não estariam tão presentes no sangue [aldosterona, adrenalina e outros]; eles emergem porque são os agentes da acima mencionada resposta adaptativa do corpo para tentar manter de alguma maneira a pressão oncótica fisiológica.
Pressão que foi comprometida, na origem, pela carência de sal. Na sequência, por aumento da permeabilidade vascular, também haverá perda de albumina. Aliás, a própria aldosterona também ativa uma molécula que aumenta a permeabilidade capilar.
Na mesma dinâmica, como já foi destacado, os rins estão poupando sal para o plasma, por sinalização que vem da aldosterona. Toda a dinâmica tenta compensar a falta de sal plasmático [D].
Não deixa de ser o seguinte: uma insuficiência alimentar promovendo desequilíbrio hormonal, presença patogênica de hormônios do estresse.
Aliás, aldosterona e adrenalina não circulam sem consequências para o conjunto da saúde.
Edema, retenção de líquido, excitação e divisão celular tendem a se desenvolver.
O volume sanguíneo foi alterado para menos.
Vale anotar aqui a importância estratégica do sal; sua carência resultou em alteração do volume sanguíneo...
Resultou em que o sangue ficou mais viscoso, “desidratado”, porque houve perda de água para o líquido extracelular [LEC]. Do vascular para o extravascular.
A saída de albumina para o LEC, promove, também, aumento da viscosidade sanguínea. E, por tabela, sua coagulabilidade, a pessoa tende a ficar com mais facilidade para formar coágulos.
[De passagem, observe-se que a oferta de sal e albumina possui potencial terapêutico lógico].
O portador de hipotireoidismo apresenta menos albumina no sangue [E], maior permeabilidade vascular, mais estrogênio e tendência a perder o líquido que estava nos vasos, desviado agora para o extravascular.
Uma consequência: o coração terá que trabalhar mais, afinal o sangue é, agora, mais viscoso. Menos água, mais concentração das hemácias, por exemplo. O sangue tende a resistir mais à pressão do impulso que vem da bomba cardíaca. O coração vai ter que bombear mais vezes ou até mais fortemente, considerando também que vai haver vasoconstrição.
“Redução do volume sanguíneo e hemo-concentração [células vermelhas formam uma enorme fração do sangue] comprometem a circulação. A pressão arterial aumenta.
O açúcar sanguíneo se torna instável, cortisol sobe, [...] Alto estrogênio, hipoglicemia, sangue viscoso, aumenta a tendência do sangue a coágulos e provoca convulsões” [R Peat, Fatigue].
E quanto às causas do problema com o sal, origem de tanto desequilíbrioɁ
Os agentes causadores daquela queda do sal no plasma ou queda da pressão oncótica podem ser: hipotiroidismo [seu papel é central], diabetes, mas também o aumento de estrogênio corporal e também a inanição, a fome crônica.
Por essa razão, a hiperestrogenização está vinculada à TPM e à eclâmpsia [e, por essa mesma lógica, o sal tem potencial para ser parte do seu tratamento]. E a progesterona, seguramente, sim, ao antagonizar com o estrogênio. E tireoide.
Pode-se resumir o papel da aldosterona dizendo que ela ativa a retenção do sódio através dos rins, também aumenta adrenalina e promove hiperpermeabilidade capilar, com perda de água – também de albumina - para o líquido extracelular, o qual aumentará de volume [enquanto o vascular diminui].
Lembrando que a adrenalina promove pressão alta e, como se sabe, libera os óleos insaturados dos depósitos corporais. Teremos mais intoxicação em marcha, mais inibição da respiração celular.
Resumindo, sobre o sal: seus níveis fisiológicos no plasma não devem cair, sob pena de várias consequências, dentre elas aumento da adrenalina que libera óleos insaturados, aumento da aldosterona que aciona adrenalina e também promove hiperpermeabilidade capilar; perda de albumina para o líquido extracelular, com consequente agravamento da queda na pressão oncótica, tendência a aumento da pressão arterial e de perda de água para o líquido extracelular, com desenvolvimento de edema, acúmulo de água nos tecidos e órgãos.
E assim por diante como se fosse uma reação em cadeia, totalmente entrelaçada em termos de causas e efeitos.
A diminuição do sódio no plasma sanguíneo derruba a pressão osmótica não apenas vascular, mas de todos os fluidos; o extravascular tende a ficar hipotônico.
O aumento da adrenalina inibe a respiração celular oxidativa, que já estava comprometida inicialmente, pela queda do sódio plasmático [por hipotireoidismo, por exemplo]. E sempre vale lembrar que o sódio é um promotor do metabolismo, da produção de energia celular.
A perda de energia celular é típica do diabetes, do hipotireoidismo e do hiperestrogenismo e, dessa forma, qualquer um deles poderia estar na origem da queda do sódio, e também significar uma queda, portanto, na produção de CO2 com consequente retenção de cálcio nas células. Teremos uma calcificação do intracelular por inibição da respiração oxidativa.
Tudo se relaciona.
Nada é uma ilha no nosso organismo, e o metabolismo é um processo onde causa e efeito constantemente mudam de lugar. A mais pura dialética.
A pressão oncótica normal, portanto, previne edema já que atrai água do líquido extracelular para manter sua normalidade; não deixa que água vaze do vascular, mantém o volume do sangue normal - o que é importante para a saúde do sistema cardiovascular e renal -, e evita que o sangue assuma um grau de viscosidade perigoso, por exemplo, do ponto de vista do desenvolvimento de coágulos indesejáveis.
Temos um status de equilíbrio nos vários parâmetros, um equilíbrio que se assentava na boa oferta de sal plasmático, em última instância [e de proteína, sem a qual o fígado não pode fabricar albumina].
Temos mais um processo que ocorre simultaneamente: a sobrehidratação das células, o “edema celular”.
Uma vez que o líquido extracelular se torna hipoosmótico, pela vinda de água dos vasos sanguíneos para ele, aparecerá uma pressão para que esta água entre na célula; portanto, o líquido intracelular se torna edemaciado, hiperhidratado e consequentemente excitado. E acumulando cálcio o qual, no caso do intracelular, é perigoso.
Esse processo conduz à morte celular se a célula não recuperar a energia para expulsar essa água; com mais água que o normal fisiológico, haverá o desencadeamento do processo de divisão celular [lembrando que o estrogênio já estará presente durante esse processo, e acionará a divisão celular].
A partir de elementos desse raciocínio fisiológico acima, pode-se observar a carga de lenda que cerca a ideia de que o sal é ofensivo para os rins [e que dieta hipossódica é boa para os rins]. O que se viu na dinâmica acima é que com a queda do sal plasmático, os rins são acionados para reter sódio no sangue.
A causa deste estresse renal: queda do sal no sangue.
Dessa forma, uma dieta hipossódica tem um efeito negativo, contrário aos rins, já que, com a hiponatremia, eles serão acionados por um hormônio do estresse, a aldosterona, na tentativa de evitar a perda de sal pela urina. E também gerando hipertensão, um dos papeis da aldosterona, junto com a adrenalina. E nunca esqueçamos: acionar aldosterona é disparar o SRAA, o sistema renina-angiotensina-aldosterona, inflamatório por natureza. É aquele mesmo sistema que é acionado [através da enzima ACE-2 em infecções respiratórias].
Retomando a mesma questão do ponto de vista energético, queda na energia corporal [queda do sódio plasmático tem esse efeito] provoca resposta corporal de estresse, tentativa de reequilíbrio.
Para complicar, ocorre que há pessoas que já vivem em um estado prévio de baixa energia corporal, como é o caso de quem tem diabetes, hipotireoidismo e hiperestrogenismo; nesse caso o corpo acionará respostas adaptativas ainda mais intensas já que a energia da qual se parte – isto é, o patamar de produção de energia - é inferior à condição de quem produz energia oxidativa melhor, em patamar superior.
Como se viu, a resposta adaptativa mobilizou hormônios como adrenalina, aldosterona, também o estrogênio e, na sequência, com várias consequências negativas do ponto de vista fisiológico. Isto é, a resposta adaptativa estará se convertendo em desadaptativa. Um processo que deveria, em principio, ser transitório.
E na medida em que não sejam passageiras, abrem caminho para hipermeabilização capilar e seus efeitos, inflamação e sintomas clínicos tipo TPM, eclâmpsia, hipertensão e uma longa lista. A qual, evidentemente, precisa do tempo para se desenvolver clinicamente.
De toda forma, não se deve perder de vista na perspectiva da totalidade – que o conjunto dessas respostas obedece ao influxo geral de sobrevivência e adaptação a um estado básico de baixa energia.
Portanto são respostas de sobrevivência, e o corpo as toma em função do seu objetivo maior: a autopreservação. Logicamente, tendo que pagar um preço fisiopatológico por esse movimento.
GM Fontes, São Paulo, 27-12-23
As informações aqui presentes não pretendem servir para uso diagnóstico, prescrição médica, tratamento, prevenção ou mitigação de qualquer doença humana. Não pretendem substituir a consulta ao profissional médico ou servir como recomendação para qualquer plano de tratamento. Trata-se de informações com fins estritamente educativos.
Notas __________________
[A] A albumina é uma proteína produzida naturalmente pelo fígado humano, mas que também pode ser encontrado em alta quantidade no leite e na clara do ovo. Sua principal função é manter constante o nível de pressão líquida nos vasos sanguíneos. No leite há albumina, embora a caseína seja predominante; a albumina é sintetizada pelo fígado. Não deve aparecer na urina. Em queimaduras e hemorragias graves se repõe albumina [já que seria necessário, proporcionalmente, muitíssimo sangue para repor a albumina perdida naquela emergência]. Wiki
[B] A aldosterona é a molécula efetora final do sistema renina-angiotensina e atua nas células epiteliais do néfron distal e do cólon promovendo a reabsorção de sódio [tem a propriedade de reter água] e excreção de potássio. A aldosterona integra o SRAA [sistema renina-angiotensina] e aumenta a pressão arterial, como a adrenalina. Wiki. E a aldosterona também é inflamatória.
[C] Pressão oncótica é a pressão osmótica gerada pelas proteínas no plasma sanguíneo, isto é, a pressão oncótica é a pressão exercida principalmente pela albumina (70% da pressão) pois é a que se encontra em maior quantidade no plasma (cerca de 50%). wiki.
[D] De onde se conclui que a suplementação do sal seria terapêutica.
[E] A importância da presença adequada [valores normais] de albumina no sangue é estratégica. Nas emergências, terá melhor prognostico quem possuir melhores níveis de albumina [também de testosterona, de DHEA].
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