Pesquisa Talks é uma newsletter quinzenal feita por duas pesquisadoras de conteúdo para projetos audiovisuais.
Por Barbara Heckler e Camila Camargo
Molas
Tinha recém-completado 16 anos e vi minha primeira oportunidade de trabalho na vida. Fazia colégio técnico de publicidade e a professora de marketing precisava de um estagiário de criação na agência dela. Fui olhar os requisitos: saber CorelDraw. Uhmm, pensei, tenho noção. Saber Photoshop, dou pro gasto. O que havia aprendido tinha sido na escola mesmo, mas me banquei. Resolvi fazer meu currículo de forma “diferentona”. Minha mãe ao lado, me incentivava. Se não me falha a memória, lembro de ter feito como se fosse uma carta animada, com um sol fechando como um “selo” no envelope virtual que continha minhas poucas habilidades na parte de dentro. Não tenho ideia do conteúdo escrito, mas me recordo do início, ideia da minha matriarca: “Venho por essa MISSIVA” - escreve assim, Babi, é mais chique. HAHAHA.
Cafona ou não com esse texto da década de 1950 e essa carta tosca, fui chamada para um teste. Fabiano seria o meu chefe e ele me deu algumas tarefas. Fiz o que deveria ser feito e alguns dias depois fui chamada! R$180 seria a minha remuneração, que era o valor do salário mínimo à época (chocada quando penso nisso hoje), e eu estava SALTITANTE.
Fiquei dois anos trabalhando nessa agência e o Fabiano foi um dos melhores mentores que já tive em minha carreira. Aprendi muito com ele e seu didatismo. Certa vez, me confessou: “quando você fez o teste, eu sabia que não tinha muita noção dos programas como precisávamos, mas entendi que você estava com muita vontade e pegava rápido”. Ele poderia ter optado por alguém mais gabaritado, mas me escolheu para me impulsionar.
Embora carregue ainda um certo conhecimento de criação, acabei não seguindo a publicidade na faculdade. Embarquei no jornalismo, que tocava meu coração de fato. E também nessa profissão tive a sorte de ter um chefe que apostou em mim. O João Gabriel era o diretor de redação da revista BRAVO! e, após a saída de um editor, ele poderia contratar alguém de mesmo porte, subir de cargo algum dos outros editores, ou efetivar 3 repórteres. Escolheu a terceira opção, para alguns descontentes, arriscando em pessoas novas para desenvolvê-las. E eu era uma delas. Tornei-me repórter de música (chorei quando recebi essa notícia) e, para além do cargo, o João ainda desafiou a mim e as outras duas colegas ao sugerir de fazermos pelo menos uma matéria de capa ao longo do ano. Hoje reconheço o quanto ele foi generoso em nos proporcionar essa incumbência. Por fim, batalhei seis meses numa reportagem com o Caetano Veloso e ela aconteceu. Virou capa em 2011 e é meu pequeno grande troféu.
Hoje, como freela, sou chefe de mim mesma e as hierarquias se dissolveram de certa forma. Por mais que eu responda a uma produtora/ diretora/ roteirista - e aprenda com elas algumas vezes, essas são minhas contratantes, desempenham outros cargos. Em busca de pessoas que me impulsionam, tenho a felicidade de ter talentosíssimas pesquisadoras amigas ao meu redor. Num café, numa mensagem, ou quando trabalho com elas como duplas, sinto uma mola propulsora real de acreditar em mim - e eu, nelas. Ô sorte!
BARBARA ama pesquisar com suas pares
Foto feia
Dia 23 de novembro, tava lá no Google Agenda: "Renovar CNH, Poupatempo Lapa". Além da parte funcional, eu queria muito trocar a 3x4 deste documento. Uma besteira? Pode ser. Mas há tempos a foto feia me acompanha: cabelo chapado demais, boca levemente torta pra direita, olhar desenxabido, como diria minha avó. A verdade de um clique, disparado em meio segundo e congelado por anos como uma espécie de cartão de visita em cadastros de portaria, check-in de hotel ou aeroporto, cartórios, locações de carro e bicicleta.
Tudo bem que raras pessoas são fotogênicas no 3x4. É como ser bonito acordando, muitos nem tentam. Mas se a cada 10 anos temos uma nova chance de alterar esse registro para melhor, por que não tentar? Uma noite bem dormida, pele hidratada, cabelo penteado, um rímel e um blushzinho de leve. Expressão neutra, mas com carisma. Tava tudo no radar. Mas acontece que eu não fui ao Poupatempo Lapa no dia 23.
O motivo era nobre, um trabalho incrível de pesquisa que tomou minha atenção e deletou por completo o maior dos menores problemas que tenho: a 3x4 esquisita. Remarquei para 5 dias depois, quando o inferno astral estava em chamas e os compromissos de trabalho se empilharam. Desliguei o laptop no fim da tarde e pulei pro Uber, como se fosse um compromisso burocrático qualquer. Ato irrefletido, puro ímpeto de cravar no Poupatempo às 18h15. Foi assim, já no meio do caminho, que percebi ter negligenciado 100% do checklist da foto bonita. "Volto pra casa? Não, para com isso, vamos como está."
A mão ainda percorreu a bolsa, em vão, na esperança de encontrar um pente, um batom que seja. Quando a senha piscou no painel, o mau presságio veio. "É, não vai rolar". A atendente acompanhou entediada minha tentativa de ajeitar o cabelo com as mãos, usando o celular improvisado de espelhinho. Olhei pra câmera, quando ela disparou o flash. Um semi sorriso - poucas coisas são piores do que isso. "Quer mais uma?". A segunda, mais séria, ficou só bem ruim. Ouvi as longas unhas dela batucando na mesa. "E aí, qual das duas você prefere?". Não havia uma terceira tentativa. Compreensível, a ideia tá no nome: poupar tempo. Que venha bem preparado aquele que quiser garantir uma 3x4 maneira pra próxima década.
"Como mudar foto CNH SP", digitei depois no Google. Ciente do ridículo da situação, mas ainda interessada no resultado, acabei chegando nesta matéria de 2017, com o fotógrafo mineiro Filipe Borges. Ali na hora do clique, ele conquistou o direito de ter uma 3x4 legal, no caso sorridente. A argumentação, junto ao Detran, foi de que o semblante sério era infundado, herança de um tempo em que não havia tecnologia de iluminação suficiente. Assim, para não borrar a imagem, as pessoas tinham que ficar muito tempo paradas, enquanto a foto estava sendo feita. Setenta e uma mil pessoas curtiram o relato dele no Facebook. Aqui, nada mudou, continuo sem solução para o meu infortúnio, mas o coração ficou quentinho. Nada como se sentir acompanhada, em pequenos ou grandes delírios.
Camila pesquisou e resolveu se dar uma segunda chance: vai renovar o RG
📌 Uma Dica de Cada
[Barbara] Com uma bebê em casa, cada minuto de sono é sagrado. Mesmo assim, deixei alguns de lado, pois o romance A Segunda Mãe, de Karin Hueck, me pegou. Trata-se de duas mulheres enfrentando a maternidade e questões de gênero, numa realidade social diferente e bem inusitada, por sinal. Por quê? Confesso que o fato de não ter lido a sinopse, nem nada, me deixou uma deliciosa surpresa ao longo da leitura. Recomendo fazer o mesmo.
[Camila] Jingle bells. As luzes, a neve artificial mesmo quando o verão já está à espreita, a fila no supermercado, a criatividade nos enfeites da árvore. Todos os estrangeirismos, com um toque tropical. Os filmes açucarados dos streamings (veja todos os lançamentos de 2023 aqui). Cereja, pêssego, abraços, rabanada, panetone. Cartões de presente com bonecos de neve e glitter dourado. Eu amo o Natal 🎄✨
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